quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Silêncio



As explicações me enlouquecem
É só barulho sem razão
Como se você pudesse
Explicar o que não tem explicação

Deixe que o silêncio tente explicar
O que sinceramente não sei
Deixe tudo silenciar
O silêncio é minha nova lei

Deixe-me sentada
Pensado na vida
Olhando pro nada
Dor sofrida

Deixe que eu fique sem nada dizer
Deixe que eu me busque e me perca
Deixe-me esquecer
Deixe que eu fique quieta

Não é pecado não opinar
Não é pecado não saber
Só quero silenciar
Tanto eu quanto você

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Sereia do mar

Praia da Sereia - Maceio/AL - By Claudia Souza
Ela é oxum
Das cachoeiras
Da umbanda e candomblé
Nos cantos da capoeira
Da Bahia todo axé

Ela é uma ninfa para os gregos
Tanta beleza assim não há
Como Afrodite acredite
Nos mistérios que aqui há

Rainha das águas
Sereia do mar
Com seu lindo canto
Canto de Iemanjá

É mito,
É sagrado,
É orixá
No vale encantado
Mistério a cantar

E o pescador que ouve seu canto
Beleza e espanto
Mito e poder
Hipnotizado pela beleza
Que nunca viu em outro ser

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Nosso Lar






Nascer do Sol - Por Claudia Souza
Eu admiro
Eu olho e respiro
Calmamente observo
O que há de mais belo

Não é só olhar
Mas também explorar
Buscar compreensão
É minha missão

Irônico narcisismo
Burro egoísmo
Esqueçamos o espelho
Há um mundo tão belo

É lindo e imenso
Inteiramente nosso
Nosso habitat
O que chamamos de lar

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Busca

Vitral da Catedral da Sé - Centro de São Paulo. Por Claudia Souza
Sou tão diferente?
Só eu não enxergo?
Insistentemente
Busco e me perco

Dizem que aqui é sua morada
Não faz sentido
Olho e não vejo nada
Não estou em território amigo

Sua ausência nesse lugar
Faz todo sentido pra mim
Não há nada pra olhar
Pois você não está aqui

Nessas paredes frias
Não encontro o calor da fé
Não encontro alegria
De joelhos, coração em pé

Obra da humanidade
Você não está aqui
Em minha verdade
Está em todos e em mim

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Dança Cigana

Dancei
Corpo em movimento
Buscando perfeição
Um doce momento
De sonho e ilusão
Seus olhos
Vidrados em mim
Meus olhos fechados assim
Entregue a melodia
Eu dançava
Você sorria
Meus passos certos
A fogueira a aquecer
Eu rodava mais
Pra você poder me ver
As palmas não paravam
A música intensa
Me perdi na dança
Senti sua presença
Te procurei
A música parou
Tudo perdeu o sentido
A intensidade cessou
Eu te imaginei
Você já havia partido
Meu coração cigano chorou
Coração ferido
Mas eu continuei a dançar
Pois quando danço fecho os olhos
E quando fecho os olhos
Sei que você está comigo
Dançarei até perder as forças
Para em seus braços encontrar abrigo.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Eclipse

Já diziam os antigos
O mundo vai acabar
Conselho muito amigo
Nem se pode imaginar
O fim está próximo
Teremos muitos sinais
Valores em destroços
E avisaram ainda mais
Quando o fim chegar
Crimes horrendos vamos ver
Violência até no lar
Sociedade a padecer
Barbaridades acontecerão
Todos abalados
Mortes sem nenhuma razão
Andar desconfiado
Tragédias naturais
Terremoto, furacão
O amanhã não há mais
Não vemos solução
O caminho já estreito
Mais estreito vai ficar
Com muita dor no peito
Para o fim caminhar
Tudo isso estamos vendo
E muito mais iremos ver
Mesmo não querendo
Questionamos o ser
O que vai acontecer
Quando tudo terminar
Não posso saber
Mas posso imaginar
A Terra ficará escura
Por um breve instante
E então o sol tornará a brilhar
Um brilho constante
Apenas a natureza
Os animais a caminhar
Ainda sem a certeza
Do que estão a olhar
Mundo não acaba
Humanidade sim
Mundo se renova
Humanos tem fim
A escuridão?
Foi apenas um eclipse
Eliminação
Pra Terra resistir

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Agradecimentos

Galerinha...
brigadão por todos os selinhos que tenho recebido...
ainda estou muito desorganizada e não consegui postar os ultimos que recebi.
mas agradeço a todos pelo carinho.
Beijos

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Sei...

Sei que a verdade se esconde
Por entre as marcas em minha face
Que adquiri não sei onde
Que não aceitam disfarce

Sei que minhas livres escolhas
Caminhas por entre as ruas
E eu dentro de uma bolha
Ignoro a verdade nua

Sei que um dia cairá por terra
Todas as incertezas
Nada será como era
Nem mesmo minha tristeza

Sei que dói certas verdades
Assim como dói o amor
Mas busco a realidade
Mesmo me trazendo dor.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Desejo a mim mesma

Desejo a mim mesma mais 20 anos regados a muita poesia.
Que eu viva intensamente e que possa encontrar tudo o que busco na vida!
E que encontre pessoas especiais no caminho... e que saiba driblar as não tão especiais assim...

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Noites Insones


Fecho os olhos e cai morto o mundo inteiro
Em minhas noites insones o silêncio é companheiro
Silêncio profundo e externo, obviamente
Há sempre barulho em minha mente

Questiono nessas horas minha sanidade
Confundo tudo com liberdade
Encontro tanta lucidez em mim
Quanto vejo anjos e querubins

Fecho os olhos e cai morto o mundo inteiro
Esqueço meu nome verdadeiro
Na noite escura e assustadora
Me assusta a minha mente perturbadora

Abriria meus olhos pra ver o mundo renascer
Mas os olhos já estão abertos sem que eu possa ver
O mundo está vivo sem que eu tenha noção
Morta mesmo está minha razão

Inspirado na poesia “Mad Girl's Love Song” de Sylvia Plath

sexta-feira, 5 de março de 2010

Escritora

Uma escritora é essencialmente uma espiã
Espia a realidade e a transforma em ficção
Quando poetisa adquire maior missão
Espia os sentimentos  
Os transforma no que quiser
Em rima, em verso
Em sentimento cantado
Amor falado
Ódio declarado
Escritora vaga por entre as ruas da cidade
Observa o mundo a sua volta
O olhar o mendigo deitado
Do garoto drogado
O motorista apressado
Alguém a passar
Os prédios, as ruas
Os becos e estátuas
Tudo ganha um significado diferente
Na mente escritora
Até mesmo um cachorro dormindo
Torna-se personagem de suas tramas
Eu sou essa escritora
Ou pelo menos, sou uma delas
No meu caminho
Cada detalhe ganha um significado diferente
Como escritora, cometo meus crimes
Grito em silêncio
Digo o que a boca insiste em não dizer
Espalho meus sentimentos
E ainda tenho a audácia de ao menos tentar
Desvendar e espalhar os sentimentos alheios
Meus olhos são cheios de confissões terríveis
As minhas e as de outros
Os outros que povoam minha alma
Minha mente confusa de escritora

Nota: Inspirado na poesia “The black art” de Anne Sexton

quinta-feira, 4 de março de 2010

Aviso

Meus queridos amigos,

não fiquem bravos com essa humilde aspirante a escritora que vos escreve.
"Desprovida" ficará um tempinho sem continuação...
Eu me explico.
Estou participando de concursos, estou me dedicando aos estudos e ainda tenho que trabalhar. Fora isso tenho uma vida pessoal ativa.. rs
Prometo que assim que tiver um tempo irei continuar e ai posto pra vocês.
No geral as poesias continuaram a serem postadas, pois tenho um grande arquivo, e poesia eu escrevo a toda hora, em todo momento.
Peço que não se afastem do meu bloguinho que é feito com todo carinho pra vocês.

Um grande beijo da Poetisa!

terça-feira, 2 de março de 2010

Queria


Queria poder te contar
Em profundo silêncio
O quanto posso te amar
Em um breve momento

Eu queria uma noite
Olhando estrelas
Eu queria uma tarde
De rimas verdadeiras

Eu queria um dia
Sem nada dizer
Eu queria a eternidade
Só eu e você

Eu queria a distância
Que cabe em um beijo
Queria um breve
E eterno desejo

No silêncio das palavras
O motivo do grito
Queria poder explicar
O amor e o mito

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Incomodo!

Tudo em mim incomoda
Afeta os conceitos
Meu costume fora de moda
De impor meu jeito

Quando peço bom senso
Quando quero ficar só
Quando preciso de silêncio
De ninguém ao meu redor

Minha falta de humor
Meu riso sincero
Meus gestos de amor
Quando amor espero

Tudo em mim incomoda
Causa desconforto
Meu jeito não se molda
Não cedo sem esforço

Minhas dores incompreendidas
Incomodam ainda mais
Só desejo na vida
Encontrar minha paz

Não peço compreensão
Nem que entenda meu jeito
Jamais pedi admiração
Mas exijo respeito

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Desprovida - Parte V

A tarde passou da forma mais inquieta possível. Ela pensava e se remoia. Não sabia se iria a esse encontro. O beijo foi sem dúvidas a coisa mais incrível que aconteceu em sua vida até então. Nunca havia sentido uma coisa tão inexplicável. Fernando parecia agora alguém muito mais real pra ela. Além de real agora dividiam um sentimento, compartilhavam um segredo, um beijo, um campo de flores e possivelmente um balanço. Cecília não adaptada a romances de alguma forma sentia que aquilo era especial.
Dedicou-se a seus afazeres, organizando o jantar com a mente em outro lugar. A mente em Fernando. Não sabia por que, nem como explicar, mas sentia que pelo resto da sua vida teria sua mente em Fernando. Sentia que mesmo que algo ruim acontecesse nunca mais conseguiria expulsa-lo de seus pensamentos. Da mesma forma sentia uma angústia, um medo. Medo de ser esquecida. Medo de estar se iludindo, de Fernando partir de sua vida. Sua vida já não faria o menor sentido sem aquelas emoções e ela estava certa que somente Fernando era capaz de desperta-las.
Serviu o jantar, absorta em pensamentos, não tocou na comida. O pai logo se preocupou, mas preferiu permanecer calado. Para ele mais valia o silencio do que a decepção, e no fundo sabia que Cecília estava mudada. Sabia também que essa mudança acontecera no dia em que a flagrou na praça. Aquele sem duvida foi a primeira vez que ele olhou pra Cecília e percebeu que não a conhecia. Antes eram apenas dois seres que não compartilhavam sentimentos, pois não os conhecia. Agora os sentimentos que ambos exploraram os havia destruído qualquer aproximação. Não que um dia tivessem sido realmente próximos. Mas em simplicidade compartilhavam assuntos, coisas bobas e cotidianas. Agora Cecília parecia estar em outro mundo e ele não sabia como resgatá-la.
  Após o jantar o pai como de costume ficou cochilando no sofá. Ela ainda incerta resolveu sair. Depois de muito se preocupar com a aparência, entrou em seu novo quarto, e pegou um dos vestidos de sua mãe. Cor de vinho, divino. Vestiu-se apressadamente e saiu antes que o pai visse, pois não saberia o que responder caso ele perguntasse aonde iria.

Com passos rápidos caminhou até o balanço, já eram nove horas. Ela sentou e esperou que ele aparecesse. Descobriu que a espera e a ansiedade é um veneno pra alma. Momento de espera, alma inquieta. Medo e alegria misturados com a esperança de ver um ser que até pouco não era nada e agora já era amado. Ficou a pensar no que Fernando significava. Viu que era um significado enorme e complexo, que seu ser havia se transformado por inteiro. Mais que isso, viu que seria capaz de mudar ainda mais se isso significasse ter ele por perto.

9h15

Agora o coração já estava disparado. Mil questionamentos. Aconteceu alguma coisa? Ele esqueceu? Se atrasou? Desistiu?
A espera, a incerteza, fere ainda mais do que a certeza da ausência. Na espera ficamos a divagar sobre o que aconteceu, e a mente humana tem o dom de esperar o pior. As nossas suposições às vezes machucam mais que a verdade. Duro é quando depois que criamos uma ferida aberta com as suposições vem o vinagre da verdade pra piorar tudo. Mesmo enlouquecendo nossos sentimentos sempre existe no mundo uma pessoa que espera a outra.
Cecília ficou divagando, o coração doía no peito. Parecia que em seu peito batia um oco. Esperou em vão por quase uma hora e ele não apareceu. Segurou também em vão as lágrimas que rolaram insistentemente por sua face.
- Te odeio – falou baixinho tentando confortar o próprio coração. Tentando enganar a si mesma. Tentando fugir.
Levantou, respirou profundamente e voltou a sua casa. Ele estava brincando com seus sentimentos, e ela não sabia o que fazer.

Correu pra casa e entrou rapidamente em seu quarto. Chorou até que o sono a dominasse. Sonhou com o beijo. Pelo menos no sonho Fernando a amava. Decidiu tentar esquecer. Fim. A ilusão que mantinha acesa seus sentimentos estava agora ferindo sua alma.
Não poderia amá-lo, não poderia se permitir sofrer.
Acordou cedo, como de costume. Os olhos estavam vermelhos e inchados. Seguiu sua rotina na esperança que ela a levasse de volta ao seu antigo estado de espírito.
Coração apertado, a vontade de chorar não passava. Caminhou até a janela e lá chegando encontrou um envelope

“Apenas leia.
Ass. Fernando”

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Desprovida - Parte IV

Duas semanas, e ele não dera sinal de vida. Ela ansiava por vê-lo, mas não se atrevia a procurá-lo. O pai não comentava sobre o trabalho em casa e ela não ousaria perguntar. Talvez ele tivesse ido embora. Depois daquela tarde em que ele a viu cantando ela não mais conseguiu parar de pensar. A cena se repetia mil vezes em sua cabeça. Foram não mais que 5 minutos de conversa que a deixavam extasiada só de lembrar.
Êxtase, ansiedade, sentimentos complexos demais, confusos demais, ela até sentia náuseas. Estranho como não uma pessoa, mas apenas o fato de saber que ela existe pode trazer tanta inquietude num coração habituado a ser quieto.
Agora ela não era mais tão desprovida de vaidade, sempre na ânsia de vê-lo se arrumava um pouco melhor, passava perfume e o batom quase sem cor. Esperava que um dia ele fosse voltar a sua casa, nem que fosse pra falar com seu pai. Ou talvez não, talvez a conversa não houvesse tido o mesmo significado pra ele.
O pai pediu que ela levasse seu almoço até a marcenaria, com o coração inquieto na hora combinada ela saiu de bicicleta. O caminho não era longo, porém o sol a deixou tonta. Ao passar próximo ao roseiral da cidade, o cheiro lhe deu a sensação de estar distante. Ela abriu os braços. Chegou a escorrer uma lágrima de emoção, o doce cheiro, o vento nos cabelos. Liberdade. Sentida e não compreendida.
Se ele estivesse trabalhando com pai por certo estaria lá. Ao chegar ao galpão sentia seu rosto queimando, o coração acelerado. Tentando se recompor ela caminhou com passos lentos.
- Pai?
- Oi filha, entre. – disse ele saindo de um corredor de madeiras.
- Trouxe o almoço. – disse ela olhando em volta na esperança de ver Fernando.
- Obrigado!
- Pai o senhor não acha que precisa de um ajudante?
- Sim, eu contratei um.
- É? Eu conheço? – o coração ia saltar pela boca.
- Obrigado filha por sua preocupação e pelo almoço, agora vá pra casa. – ele havia ficado mais sério que de costume.
- Está bem, até mais tarde.

Ela saiu decepcionada, e seguiu seu caminho distraída com seus pensamentos. Quando passou novamente pelo roseiral, não sentiu a sensação de liberdade, não sentiu nada. Estava voltando ao normal.
Surgiu do seu lado direito uma flor vermelha, ela quase caiu da bicicleta, tamanho o susto.
- Desculpe, não achei que fosse se assustar.
Era Fernando, seus olhos se encontraram por um momento e Cecília pensou que fosse desmaiar. A alegria em seu coração foi tamanha que ela perdeu as palavras. A alegria tem dessas, envolve tanto a gente que nos deixa meio que parados no tempo. Talvez porque os momentos de alegria sejam tão raros que paralisamos um momento para quem sabe, aproveitar um pouco mais.
- Cecília desculpe. – ele agora parecia preocupado.
- Tudo bem.
- Estou trabalhando com seu pai, e aproveitei meu horário de almoço pra cochilar um pouco aqui no roseiral porque aqui é bem silencioso. Exceto por hoje.
- O que houve hoje?
- Estava dormindo quando ouvi um barulho de uma bicicleta se aproximando, olhei e era você.
- Desculpe eu não te vi.
- Eu sei, você estava linda com os braços abertos.
Parecia que seu mundo de repente havia tomado outra tonalidade. Linda. Ela nunca fora chamada de linda, nunca elogiada. Muitas vezes sentia como se nem existisse.
- Preciso ir
- Ainda tenho alguns minutos de almoço, me faz companhia?
- Faço. – e pensou “Porque disse faço? Que loucura...”
Ela não sabia o que dizer, ou como agir. Caminharam sem conversar, ela observava o cenário a sua volta. Seria perfeito se ele tivesse algum interesse por ela. As rosas espalhavam um aroma profundo, o céu estava claro e sem nuvens, o caminho que se estreitava fez com que os braços se tocassem por um breve instante. Ela não sabia o que pensar. Ele agora parecia distante, sério. Ele a chamou de linda, mas agora não a olhava. Porque ele a deixava tão confusa.
O silêncio começou a incomodar, e ela pensou em voltar pra casa, quando ele segurou em sua mão. Ela nunca antes sentiu aquilo, um toque de carinho.
- Eu não queria te afetar com meu jeito, te fazer mal sabe?
- Mas não faz.
- Entenda Cecília, eu não sei ser bom.
- Comigo você está sendo.
- Só não sei até quando.
Ela sentiu uma amargura na voz dele, teve um mau pressentimento. Em sua mente confusa pensou em correr. Estava virando quando ele a tomou nos braços e a beijou. Um beijo profundo, intenso. Dizem que os beijos dão a impressão de que se está voando. Não para ela, aquele beijo lhe deu um toque de humanidade, a aproximou do mundo real.
Quando o beijo acabou, Cecília pensou que iria voar. Fernando não acostumado com pessoas tão sensíveis ficou sem reação. O melhor beijo é aquele que não esperamos, mas quando acontece, a gente sente que esperou por ele a vida toda.
- Agora preciso ir – disse ela sentindo-se queimar de vergonha.
- Desculpe, eu não quis te ofender.
- Não ofendeu.
- Então não vá.
Cecília não sabia o que fazer e sem conseguir pensar viu que fugir era sua única opção. Correu, pegou a bicicleta, mas antes olhou pra trás e viu que Fernando estava parado no mesmo lugar. Sentiu uma vontade de voltar e abraçá-lo, mas não tinha coragem pra isso.
- Cecília – ele gritou
- Sim.
- Te espero as nove no seu balanço.
Ela não conseguiu responder, apenas saiu rapidamente e voltou pra casa.

Ao chegar em casa ainda sentia seu coração acelerado. Sentou–se na janela na esperança de voltar a sua habitual paz. Agora era uma coisa antiga em sua vida, passado. Como aquele menino a deixava angustiada e alegre ao mesmo tempo? Como uma pessoa que mal conhecemos pode alterar nossa rotina?

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Desprovida - Parte III


Ela voltou pra casa ainda com o coração descompassado, nunca imaginou que teria medo de entrar em casa, mas ao ver que o pai estava na janela sentiu o corpo tremer. Nunca havia apanhado do pai, mas agora tinha certeza que iria levar uma surra.
Abriu a porta e surpreendeu-se com a voz tranquila do pai:
- Já estava preocupado.
- Pai eu só queria...
Ele a interrompeu levantando-se e a conduzindo pelo corredor
- Eu não quero mais falar nesse assunto está bem? Agora vá descansar, tivemos um péssimo dia.
- Na verdade eu queria...
Ele novamente a interrompeu, parecia exausto, seus olhos estavam inchados, e mesmo com toda a altura que tinha parecia um homem fragilizado.
- Filha, acho que agi mal, mas a partir de hoje o quarto de sua mãe é seu.
- Meu?
- Acho que ela gostaria que eu fizesse isso.
- Pai eu nem tenho como agradecer...
- Agradeça não me decepcionando como fez essa tarde.
- Fique tranqüilo eu...
- Boa noite.
Ele estava triste, mas a alegria que ela sentia a impediu de ver isso. Ela estava radiante e isso era algo inédito.

Correu para o seu novo quarto e se surpreendeu ao entrar, o pai havia arrumado tudo, trocado cortinas e lençóis, tirado a poeira. Ela ficou maravilhada e naquela noite dormiu profundamente, nunca havia dormido numa cama tão grande e tão macia. Naquela noite sonhou e quando acordou parecia que ainda estava sonhando, sonhou que o moço novo na cidade a havia beijado e foi bom, ela ainda não sabia como era beijar, mas nos sonhos tudo é possível.
Olhou no relógio e viu que já eram dez horas, o pai viria ao meio dia para almoçar e ela ainda não havia preparado nada. Como pode dormir tanto? Levantou-se apressada e viu um papel colado no espelho, a péssima letra do pai que ela bem conhecia:
“Não virei para o almoço”
Ela se sentiu aliviada, teria tempo para por as idéias em ordem, coisa que ela nunca precisava fazer antes, sempre tivera a mente tão vazia. Não sentia mais aquela paz, sentia-se inquieta com uma vontade de não se sabe o que. Mas sentia-se bem. Ligou seu rádio, a sua única conexão com o mundo já que televisão era raridade naquela cidade, e se permitiu viajar por alguns instantes, a canção por trás do chiado falava de amor, e naquele momento ela desejou ser amada.

Ela estava a cantar, cantava com a alma, cantar era sua única ligação com o mundo dos sentimentos intensos. Talvez porque sentir exigia uma profundidade muito complexa para quem desde cedo se adaptou ao vazio. Ela cantava sentimentos que não eram seus, que jamais ousara pensar na possibilidade de senti-los. Naquele momento era uma atriz explorando uma realidade que não conhecia, e explorava sem saber. Tinha uma bela voz, e também isso ela ignorava, nunca haviam te dito isso porque ninguém nunca a ouvira cantar.
Mas naquele momento de contato com sentimentos ele a ouviu. Ela de olhos fechados, pois assim os sentimentos se intensificam, não o viu chegar. Ele que chegava emburrado, ate esqueceu o motivo da birra quando a ouviu. Ficou ali parado a olhar pela janela da sala, enquanto ela cantava e dançava por entre os móveis. Quando conseguiu novamente raciocinar ele enfim conseguiu quebrar o encanto do momento:
- Você canta bem.
Uma frase tão simples pode causar sentimentos tão complexos em uma pessoa mais simples ainda. Ela ruborizou, e ficou sem jeito, não sabia ao certo o motivo. Fora pega desprevenida, num momento constrangedor, por um estranho. Mas ele já não era tão estranho assim, eles haviam se falado na noite passada, uma conversa pouco amigável. Ela havia ruborizado sim, pelo elogio que recebera e pela lembrança do sonho.
Ele ficou olhando e percebeu que ela não iria responder:
- Ei garota eu falei com você...
- O que? – ela parecia estar despertando de um transe.
- Você canta bem – repetiu ele rindo da falta de jeito dela.
- Muito engraçado. – disse ela agora realmente brava, ele havia invadido um momento intimo e ainda estava se divertindo. – já não se divertiu o bastante as minhas custas?
- Calma, olha eu não estou brincando não. – disse ele procurando palavras. – bom, mas como sei que você não vai acreditar deixa pra lá...
- Então diga o que veio fazer aqui? – disse ela tentando se recuperar, não entendia porque perdia tão facilmente a compostura perto dele.
- Eu vim falar com seu pai. – ele parecia contrariado.
- Ele não esta. – ela se domava e voltava ao seu estado neutro.
- Será que você pode me fazer uma favor?
- Sim
- Diga a ele que o sobrinho do seu Jeremias veio aqui hoje pra falar a respeito do emprego que ele me ofereceu.
- Você vai trabalhar pro meu pai? – disse ela querendo rir.
- Sim, ele ta precisando de ajudante e eu precisando de dinheiro. – disse ele emburrado. – Qual é a graça?
- Nada. Mas já lhe aviso que você com esse jeito todo, não vai se acostumar com trabalho pesado não.
- Jeito todo o que? - ele agora parecia bravo, e ao ver a cara de desapontada que ela fez sossegou. – Deixa pra lá vai, esquece.
- É só isso?
- Sim, obrigado Cecília.
- Como você sabe meu nome?
- Acho que seu pai te chamou em alto e bom tom lá na praça.
- Ah sim aquilo foi... – por mais que procurasse não encontrava palavras para expressar os sentimentos, sentir já era complicado, quanto mais explicar.
- Aquilo foi uma bobagem e as coisas que eu te disse ontem também. – ele pareceu arrependido.
- Foi tudo uma bobagem mesmo, eu sei que causei a impressão errada, mas por mais que você não acredite, aquela foi a primeira vez que fiquei conversando com aquelas garotas e a primeira vez que me vesti daquele jeito também.
Ele a olhou por inteiro, daria pra acreditar sim. Ela estava muito diferente, com uma camiseta enorme e uma calça cinza. Os cabelos desalinhados lhe caiam na face, ela não era do tipo que chamava a atenção, mas ele a admirou.
- Eu sei.
- Sabe?
- Sei, ontem eu estava tão frustrado com meus próprios problemas que não consegui te ver, digo, eu te vi, mas não da maneira correta.
- E eu não me mostrei da maneira correta.
- Podemos recomeçar.
- Podemos.
- Muito prazer meu nome é Fernando e eu sou novo aqui. – disse ele lhe estendendo a mão.
- Prazer meu nome é Cecília e eu não sou nova aqui...
Ela sorriu, um sorriso franco de quem realmente deseja sorrir, e ele correspondeu. Ficaram assim feito bobos sorrindo por um tempo. Estavam realmente cumprindo o combinado, pois se olhavam como se nunca tivessem se visto antes.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Assim

Nunca fui de todos,
Prefiro ter poucos,
No pouco sou bem seletiva
Minhas escolhas duram além vida

Não quero ser popular
Ter muitos amigos
É ter todos
E nenhum enxergar

Valorizo pequenos momentos
Demonstro amor no dia a dia
Não pense que é sofrimento
Às vezes prefiro ficar sozinha

Não tenho medo da solidão
Não tenho medo de mim
Conheço minha escuridão
Gosto de ser assim

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Desprovida - Parte II

Naquela tarde o pai disse que no dia seguinte iria para a cidade vizinha visitar um parente. Naquela tarde ela se sentiu feliz sem motivo. Ficaria sozinha um dia inteiro e poderia fazer o que quisesse. O dilema era saber o que queria fazer.
Logo pela manhã ficou na janela observando o pai se distanciar, seus olhos se encheram de lágrimas, e ela não entendeu por que. Permitiu-se chorar por alguns minutos, um choro sem dor, apenas chorou e quando acabou sentiu alivio e vontade de sorrir.
Correu para o quarto que um dia pertenceu a sua mãe, e lá ficou a observar todas as coisas. Abriu o imenso guarda-roupa e entre inúmeras peças achou um lindo vestido cor de rosa, todo em algodão, com um delicado laço de seda na cintura. Era um vestido simples, que aos seus olhos era o vestido mais luxuoso do mundo.
Pela primeira vez na vida ela teve vontade de se arrumar. Tomou um demorado banho, lavando demoradamente os cabelos amarelos e quando saiu do banho se sentiu outra pessoa. O vestido pareceu ter sido feito sob encomenda, lhe serviu como uma luva. Depois de abrir novamente todos os frascos de perfume, encontrou um do seu agrado, uma essência doce e suave. Abriu as gavetas, mas não sabia como usar as maquiagens, pensou em seu pai, ele a mataria. Mas ele estava longe e parecia que ela estivera morta desde que nasceu.
Depois de muito olhar perdida para a imensidão de cores viu que a única coisa que saberia usar era um batom, mas vermelho não, vermelho não parecia certo. Ela passou um batom rosa que de tanto tempo guardado não obteve o resultado esperado, imitando as garotas da escola beliscou as bochechas para que ficassem coradas. Olhando-se no espelho grande ficou um pouco mais satisfeita, agora ao menos tinha um pouco de cor.
Preparou uma pequena refeição, comeu, sentou-se na janela, entediou-se. Já estava no meio da tarde e depois de muito pensar percebeu que não tinha nada para fazer. O dia estava quente e decidiu ir a praça tomar um sorvete. Ao caminhar pelas ruas percebeu que as pessoas cochichavam e sentia suas bochechas arderem de vergonha. Estava decidida a voltar quando ouviu:
- Cecília, é você?
Virou-se lentamente como um bicho amedrontado e sentiu alivio ao ver que era apenas Ana, uma colega de classe do colégio.
- Oi Ana sou eu sim. Tudo bem? – disse ela com a timidez.
- Eu to bem e você pelo jeito esta ótima – Ana tinha a mesma voz estridente que Cecília lembrava. – o que aconteceu nunca te vi tão arrumada?
- Nada Ana. – disse ela quase num sussurro.
- Bem seja lá o que for te fez bem, está menos caipira agora. - Ana ficou olhando e como não obteve resposta prosseguiu. - Vamos nos sentar ali na pracinha com as outras garotas, ouvir as últimas novidades.
Cecília se deixou conduzir, não conseguia imaginar que novidades poderiam ter pra contar. Sentou-se num dos bancos e ouviu diversos comentários inconvenientes sobre seu visual, até que a atenção foi desviada, ela se sentia perdida no falatório, mas logo percebeu do que elas estavam falando.
Um rapaz acabara de se sentar em dos bancos acompanhado por um velho morador. Mesmo no calor ele estava com uma jaqueta preta, uma mochila nas costas, calças largas e um estranho modo de se sentar. Essa sim era uma novidade, o rapaz nunca tinha sido visto na cidade e arrancou diversos suspiros das meninas. Cecília não conseguia desviar o olhar, ele era muito diferente de todos os rapazes que já havia visto.
- Nossa quem é esse com o seu Jeremias? – disse Ana com a voz mais fina ainda.
- Novo na cidade sem sombra de dúvidas - respondeu uma das garotas.
- Precisamos nos apresentar, somos um povo hospitaleiro – disse Ana com risinhos insinuantes.
- Quem se atreveria? – perguntou a outra.
- Cecília você poderia fazer o favor de chamar aquele rapaz? – disse Ana com os olhos brilhantes.
- Eu? – quase berrou Cecília.
- Claro, você, é obvio que ele não vai querer nada com você mesmo, então não tem que se preocupar querida, apenas vá até lá e diga que sua amiga quer falar com ele.
Cecília ficou tão desestruturada com o comentário que não conseguiu responder, levantou-se e foi. O rapaz notando que a moça se aproximava parou de conversar com o velho e ficou encarando com uma expressão pouco amigável. Ela quase perdeu as forças naquela hora, mas seguiu, ainda pensou em correr, mas percebeu que ficaria com mais cara de idiota ainda se fizesse isso, então continuou. Quando estava quase chegando ouviu um grito que a fez tremer dos pés a cabeça:
- Cecília!
Ela virou-se e viu pai do outro lado da praça com o rosto vermelho como se fosse explodir. As meninas que antes conversavam com ela estavam rindo alto, o rapaz continuou encarando, e todos os demais que ali se encontravam olhavam pra ela. Correr agora parecia uma boa idéia e foi o que ela fez. Correu pra casa e bateu a porta, nunca havia sentido tantos sentimentos misturados, vergonha, medo. Não conseguia conter as lágrimas mesmo sabendo que se o pai a visse chorando ficaria ainda mais irritado, ele odiava choro.
Ele entrou como um furacão seu rosto estava vermelho, seu peito inflava, pois ele parecia ter dificuldade de respirar:
- Você quer me desmoralizar é isso?
Ela não conseguia responder estava soluçando.
- Responda... Responda agora... – ele a ergueu pelos cabelos e a olhou nos olhos. – Eu estou falando com você...
Mas por mais que tentasse, ela não conseguia falar, estava assustada, estava com medo, nunca tinha visto o pai daquele jeito. Ele ergueu a mão e ela estremeceu e gritou:
- Pai me perdoa, por favor.
Ele paralisou por um instante, a soltou e caminhou com passos fortes em direção ao quarto que um dia pertenceu á sua esposa. A porta bateu com força e ela pode ouvir o barulho de um abajur indo ao chão. Correu ate a porta encostou o ouvido e ouviu o pai respirando pesadamente e sussurrando palavras que ela não podia entender:
- Pai abre a porta. – ela gritou – nós precisamos conversar.
- Saia daqui, eu preciso ficar sozinho, depois agente conversa - disse ele abrindo a porta, pela primeira vez ela o viu chorando e ficou sem reação, ele voltou a fechar a porta e ela saiu.
Sentou-se nos fundos da casa e tentou chorar, mas as lágrimas haviam secado então ela ficou em silêncio.
O sol já estava se pondo e rua estava deserta, ela caminhou até o velho parquinho nos fundos da praça de cabeça baixa, foi em direção ao balanço e só quando chegou bem perto notou que havia alguém ali e quando ergueu os olhos o reconheceu pelo jeito e se não fosse por isso a jaqueta escura o teria denunciado. Parou sem saber o que fazer, ele soltou à fumaça do cigarro e ficou apenas olhando.
- Desculpe. – disse ela já se retirando.
- Calma moça, não vá correr novamente. – disse ele com uma voz que quebrava seu estilo mal encarado.
- Não ia correr, só não quero atrapalhar.
- Você ia falar comigo essa tarde?
- Desculpe foi um erro, aquela garota me fez ir ate você e...
- Algum problema com seu pai? Ele é seu pai né?
- Sim é meu pai, ele esta zangado, muito zangado, mas depois iremos conversar...
- Já cheguei criando problemas... – disse ele sorrindo ironicamente.
- A culpa não foi sua, foi uma bobagem. – disse ela se sentindo envergonhada.
- A culpa é sempre minha e eu já me acostumei com isso.
- Estranho!
- Não é estranho é a realidade
- Você é confuso.
- A vida é confusa.
- A minha nunca foi.
Ele se levantou do balanço jogou o resto de cigarro no chão, se aproximou dela e a olhando nos olhos disse:
- Então é melhor ficar longe de mim!
Ela se sentiu corar, ele desviou dela e foi caminhando.
- Porque eu me aproximaria? – disse quase sem coragem.
- Vocês tolas menininhas de interior, ficam parecendo bonecas sentadas na rua observando seus futuros maridos e quando avistam um recém chegado na cidade logo se empolgam, mas eu já lhe aviso que não tenho interesse. – ele parecia nervoso, pela voz parecia que estava chorando, e estava, o que ela não viu porque ele se manteve de costas.
- E eu já lhe aviso que não sou assim. – disse ela usando toda a rispidez que continha em seu ser.
- Não foi o que eu vi essa tarde. – disse ele com ar de deboche continuando a caminhar.
Ela ficou sem resposta e por mais que quisesse se explicar, já seria tarde porque ele já havia sumido do seu campo de visão. Ela ficou furiosa, que rapaz mais ousado, arrogante.
Sentou-se em seu balanço, mas não conseguiu relaxar, ele a havia deixado inquieta, seu coração batia descompassado e no silêncio ela podia ouvi-lo. Estava com raiva e esse era um sentimento que até então ela não conhecia. Sempre fora daquelas pessoas que passam despercebidas, era um fantasma na vida, simplesmente passava e observava. Agora se sentia viva, aquela sensação de raiva era boa, ela não conseguia explicar porque, mas começou a sorrir.